domingo, 12 de fevereiro de 2017

Fuja dos Estereótipos: Se esconda em Cristo!


            A Queda do homem (Gênesis 3.1-8) deformou (destruiu?) a imago Dei, isto é, a imagem de Deus em nós. Desde o Éden, o homem tornou-se um ser em ininterrupto conflito: Contra Deus (porque o pecado é uma declaração de guerra a Deus), contra o próximo, a começar pelo homicídio familiar de Caim para com Abel (Gênesis 4.1-7), e na realidade consigo mesmo, estamos diariamente em uma crise existencial, sintetizado na famosa expressão teatral-filosófica “ser ou não ser: eis a questão” (Hamlet- William Shakespeare). O Reverendo Hernandes Dias Lopes disse que o “homem é uma guerra civil ambulante”, a Queda, expressão do rompimento do homem para com Deus, desencadeou simultaneamente o processo de rompimento social humanitário. O Filósofo Platão (IV a.C) insistiu na dicotomia do homem, isto é, alma x corpo. Para este, a alma estava aprisionada no corpo, lutando desesperadamente por liberta-se. O mundo em si era dicotômico, a realidade imanente era uma oposição da transcendente. De fato, a dicotomia do mundo é latente. Na esfera social, a história registra conflitos entre brancos e negros, ricos e pobres, senhores e escravos (e nisso, somente, concordaria, em certa medida, guardada todas as proporções, com Karl Marx de uma “luta de classes” histórica), na esfera política se percebem a dicotomia entre direita (conservadora e/ou liberal) e a esquerda (essencialmente revolucionária). E infelizmente, nos meandros eclesiásticos, as dicotomias, tricotomias e fragmentações diversificadas também se evidenciam.
            Aos que às vezes lamentam falando a respeito de um tempo “em que os irmãos eram mais unidos” em detrimento dos dias hodiernos, tal prerrogativa é equívoca! Nos dias primeiros da Igreja cristã (primitiva), as fragmentações já se notabilizavam. A Igreja de Corinto é prova clara disso. Na sua epístola aos Coríntios, especialmente, nos capítulos I e III, Paulo trata de uma divisão existente que ameaçava a unidade da irmandade cristã. Partidarismos se formavam a ponto de uns afirmarem ser “de Paulo, outros de Apolo e outros de Cefas” (I Coríntios 1.11-12). No decorrer da História da Igreja não foi diferente. Nos idos do século II temos os apostólicos de um lado e os agnósticos do outro, no século III e IV o sério conflito entre arianos e nicenos. Temos o Cisma da Igreja Católica, entre romanos e ortodoxos, no século XI. No século XVI a Reforma Protestante introduzida por homens como John Huss (1369-1415) e Jerônimo Savonarola (1452-1498) e eclodida por Martinho Lutero (1483-1546), racharam definitivamente a cristandade e introduziu um tempo novo para a história eclesiástica. As fragmentações ainda se intensificariam mais dentro do protestantismo. Surgiria a divisão entre calvinistas e arminianos, tradicionais e pentecostais, pentecostais e neopentecostais, sem contar as inúmeras dissidências de dentro do protestantismo que deram vida a novas expressões de fé e grupos religiosos.
            Esse alvoroço todo retomou os dias da Igreja de Corinto, certamente, ainda mais agravante. O que assistimos hoje nas mídias televisivas e redes sociais é uma guerra religiosa interdenominacional indescritível. Muitos ditos cristãos têm se reduzido a estereótipos teológicos e denominacionais. Preferem identificarem-se como luteranos, calvinistas, anglicanos, pentecostais, etc., etc., evocando os coríntios que se identificavam como sendo de “Paulo, Apolo, Cefas, etc.” Não estou propondo, negarmos nossas raízes históricas- confessionais. Eu mesmo, por exemplo, assumo-me como pentecostal clássico. Foi dentro de uma denominação desse movimento que Cristo me chamou a graça, me salvou por seu amor incondicional, me deu a alegria de receber o Batismo no Espírito Santo (com a evidência inicial do “falar em outras línguas”, conforme Atos 2.1-4; Atos 10.46; Atos 19.6) e me designou para o ministério como ministro de sua palavra. Os conhecimentos objetivos das Escrituras somados à experiência subjetiva dos mistérios da fé que tenho vivido nesses anos foram dentro do contexto pentecostal clássico, onde me encontro, de onde falo, aqui é minha casa. Mas, sobretudo, ou mesmo, antes de tudo, sou cristão. É, aliás, a designação bíblica que os seguidores de Jesus, de fato, receberam, Lucas narra que “Em Antioquia, foram os discípulos, pela primeira vez, chamados cristãos” (Atos 11.26). Quando me assumo um pentecostal clássico, apenas digo que essa é a perspectiva teológica- hermenêutica de minha compreensão/confissão de fé. Mas minha vocação é ser cristão. Quando Jesus chamou os Doze (Mateus 10.1-40), chama-os para serem “seus discípulos”. O pastor e teólogo Dietrich Bonhoeffer (1906-1945), deixou-nos, antes do martírio, um livro excepcional chamado Discipulado (1937), certamente, a melhor obra sobre a temática que conheço, onde o autor nos leva a compreensão do genuíno chamado de Cristo a nós. Ser cristão e discípulo são a mesma coisa, aliás, só podemos ser alcunhados de cristãos pelo fato de termos sido matriculados no discipulado com Cristo. Os discípulos foram chamados para segui-lo, imitá-lo e dar continuidade às obras de Cristo (João 14.12/ Marcos 16.15), inclusive, “fazer discípulos” (Mateus 28.19) foi uma das últimas ordens expressas de nosso Senhor. Jesus não disse: “Sereis luteranos”, “sereis calvinistas”, “será arminiano”, “será pentecostal”, sua proposta era unilateral “sereis meus discípulos” (João 15.8) e nisto “O pai seria glorificado”, pois, os discípulos frutificam.
            O problema latente dos estereótipos é que eles guardam em si, posições extremistas que desembocam na segregação e fragmentação, no caso eclesiástico, do corpo de Cristo. Irmãos têm se digladiado em nome de teólogos e interpretes da fé, de sistemas teológicos e de denominações. Deveríamos deixar (vez em quando) os intérpretes (interpretes são falíveis) da Palavra de lado, pois muitos os têm como autoridades infalíveis (tipos de papas protestantes) e voltarmos à pureza da Palavra (sola scriptura). E o que esta Palavra diz a nós, cristãos, discípulos do Mestre é que “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (João 13.35). Discordâncias, perspectivas diferentes, ânimos aquecidos sempre haverá, mesmo Paulo e Barnabé, homens maduros e referenciais tiveram uma contenda a ponto de separam-se momentaneamente por situações em que discordaram (Atos 15.37-39). Paulo e Pedro, apóstolos modelares, de igual modo estranharam-se e “resistiram-se” (Gálatas 2.11-15). Mas mesmo em meio às discordâncias, renderam-se a “unidade do Espírito” (Efésios 4.3).  É tempo de fugirmos de estereótipos que nos separam e nos encontramos em Cristo que nos une “em um só corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres” (I Coríntios 12.13).

            

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